De passagem e paragem por terras de Basto, penso que talvez
devesse ter trazido Torga. Mas não,
porque “Há quem não escreva poesia” me chama a uma leitura nova,
pausada, como esta paisagem que me olha, tão estrangeira, quanto estes versos,
aqui, os da Carolina.
Mas eis que tudo ganha o devido enquadramento, porque o céu daqui
é também “o céu dali” e é também “mais alto” e também aqui parece que “o frio traz
a verdade”. E depois volto ao poema da Carolina e idealizo-a a “afogar o
sentimento” num outro lugar onde “a terra era maior” e “O mar era mais fundo”...
E a minha leitura continua, por entre esta paisagem de pedra, com
nuvens a romper os baixios e a erguerem-se até ao desvanecimento, e continuo a
descobrir a Carolina e a comungar com ela todo um sentimento de “sagrada
ignorância”, “o desconforto”, “a sensação de futilidade/ Da minha existência banal”.
Não, não estou em Aberdeen, não há “alcatrão molhado”, nem
“gaivotas que dançam a sua caçada”, mas há chilreios e água que corre em
torrente, num concerto desigual. Também aqui “a vida treme”, e há “edifícios de
granito velho” criando a ilusão da perenidade. Também aqui “o sol fraco” (o dia
ainda há pouco nasceu) “aquece-me a cara, e eu sou”. E percebo, que seja qual
for a geografia, a poesia tem o seu encaixe próprio. E sinto que este livro é a
nota em falta numa melodia feita de sons de ontem e de hoje, a ligação entre o
granito que me serve de banco e encosto, e os devaneios metafísicos da Carolina
que faço meus.
Nos versos de Carolina há saudade, emoção, serenidade, a
musicalidade juvenil e a força da mulher, a inteligência e a portugalidade... e
muito mais que eu, pobre leitora, não sei ver, porque “o poeta escreve para si”
e, depois, na sua imensa generosidade, deixa que cada um faça seu o poema. E
“fora isso, nada”!
E agora, relido o livro, sei que, se há quem não escreva poesia,
não é com certeza a Carolina, porque poesia foi o que acabei de ler. E gostei!
Gostei, muito!
Soni Esteves, fevereiro de 2019

Sem comentários:
Enviar um comentário