Só me lembro que havia muito frio. Por certo, não haveria sempre neve, mas essa lembrança embargou-me
a memória, e fez para sempre branco o Natal da minha infância.
E havia um pinheiro sublime, aquele que já em novembro eu
cobiçava na bouça de meus pais, coitado, que o não deixava medrar. Eram outros
tempos, outras preocupações, distantes da ecologia que hoje se apregoa. E musgo, apanhava-o em grandes “postas”, retiradas com
jeitinho dos valados dos caminhos, para os lados da tapada que tinha por nome
“cabeça de vaca”, nunca percebi porquê.
No pinheiro havia flocos de algodão e algumas fitas coloridas
que serpenteavam pelo meio daquela “neve” que, como se aquecida pela lareira,
se desfazia em finos fios pelas ramagens.
E o musgo espalhava-se num canto da cozinha, por cima de
caixas que seriam montes onde ovelhinhas pastavam, acompanhadas por um pastor.
E havia outros que, em fila, seguiam o caminho dos Reis Magos, um carreiro feito de
farinha sobre o verde, em direção à gruta mais ao fundo, muito perto do
pinheiro onde haveriam de chegar.
Lembro-me de que, num qualquer vale daquele presépio, havia
sempre um lago de espelho feito, onde se refletia um pescador que nas suas
margens ensaiava pescaria.
E pasme-se, havia uma banda daquelas que eu via nas romarias,
cujos músicos se perfilavam, como se fossem romeiros naquela caminhada para
Belém.
E era assim que o Natal ganhava forma, sentido, e espírito,
como hoje se diz, até na publicidade.
Mas o Natal da minha infância cumpria-se em plenitude quando
o Menino, por milagre, aparecia na manjedoura, na madrugada de 25 de dezembro, onde
os Reis Magos então, terminada a longa caminhada, se detinham em admiração e
oração, como eu acreditava.
E hoje, rememorando aquele canto, não sei como era tamanho o
meu presépio!
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