quinta-feira, 5 de abril de 2018

A Carne, Rosa Montero



    Gosto de Rosa Montero! Ainda não li nada dela de que não gostasse. Esta mulher sabe transportar para os seus livros personagens cheias de verdade: fortes ou frágeis, submissas ou voluntariosas, compassivas ou impiedosas, mas todas tremendamente humanas, até na desumanidade e na capacidade de nos surpreenderem! Elas poderiam ser, afinal, as pessoas que temos como amigas, colegas de trabalho, empregados ou empregadores, vizinhos, ídolos, ilustres desconhecidos, ou aqueles com quem não gostaríamos de nos cruzar, nunca!
    “A Carne” é a sua última obra, nela se apresenta Soledad, uma mulher na casa dos sessenta anos, cujas atitudes vamos entendendo à medida que deslindamos o seu passado. Por detrás da aparência forte de mulher profissionalmente resolvida e independente, capaz de contratar um gigolô para fazer ciúmes a um ex-amante, Soledad assume, página a página, uma fragilidade tocante, consubstanciada em medos absolutamente legítimos: medo de envelhecer, medo do fracasso, medo de não ser amada, medo de enlouquecer, medo do tempo, do inexorável “tiquetaque do tempo”...
    Interessante, também, é o facto de Rosa Montero ter escolhido ser personagem, não a protagonista, muito embora o seu pequeno papel ajude à verosimilhança da narrativa. Aliás, existem outras personagens reais, algumas apenas aludidas. É preciso dizer-se que a protagonista se encontra a preparar  uma  exposição sobre escritores “malditos”, o que dá ao narrador a oportunidade de contar outras histórias dentro da história, quase todas verídicas, como é esclarecido no final do livro, num capítulo destinado aos agradecimentos.
    Quanto ao título, parece-me perfeito, a carnee se tivesse dúvidas, tê-las-ia desfeito depois de ler estas palavras proferidas por Rosa Montero numa entrevista “La carne nos aprisiona, nos enferma, nos mata y también nos hace rozar la gloria a través de la sexualidad, el deseo, el amor…. Es la carne infierno y éxtasis”.
                                                                                                                                                         Soni Esteves, abril de 2018



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