Gosto de Rosa Montero! Ainda não li nada dela de que não
gostasse. Esta mulher sabe transportar para os seus livros personagens cheias
de verdade: fortes ou frágeis, submissas ou voluntariosas, compassivas ou
impiedosas, mas todas tremendamente humanas, até na desumanidade e na capacidade
de nos surpreenderem! Elas poderiam ser, afinal, as pessoas que temos como
amigas, colegas de trabalho, empregados ou empregadores, vizinhos, ídolos,
ilustres desconhecidos, ou aqueles com quem não gostaríamos de nos cruzar,
nunca!
“A Carne” é a sua
última obra, nela se apresenta Soledad, uma mulher na casa dos sessenta anos, cujas
atitudes vamos entendendo à medida que deslindamos o seu passado. Por detrás da
aparência forte de mulher profissionalmente resolvida e independente, capaz de contratar
um gigolô para fazer ciúmes a um ex-amante, Soledad assume, página a página, uma
fragilidade tocante, consubstanciada em medos absolutamente legítimos: medo de
envelhecer, medo do fracasso, medo de não ser amada, medo de enlouquecer, medo do
tempo, do inexorável “tiquetaque do tempo”...
Interessante,
também, é o facto de Rosa Montero ter escolhido ser personagem, não a
protagonista, muito embora o seu pequeno papel ajude à verosimilhança da
narrativa. Aliás, existem outras personagens reais, algumas apenas aludidas. É preciso
dizer-se que a protagonista se encontra a preparar uma exposição
sobre escritores “malditos”, o que dá ao narrador a oportunidade de contar
outras histórias dentro da história, quase todas verídicas, como é esclarecido no
final do livro, num capítulo destinado aos agradecimentos.
Quanto ao título, parece-me perfeito, a carne, e se tivesse dúvidas, tê-las-ia desfeito depois de ler estas
palavras proferidas por Rosa Montero numa entrevista “La carne nos aprisiona, nos enferma, nos mata y también nos hace rozar
la gloria a través de la sexualidad, el deseo, el amor…. Es la carne infierno y
éxtasis”.
Soni Esteves, abril de 2018
Soni Esteves, abril de 2018

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