Era uma vez uma bibliotecária que tinha sonhos. Nada de mais, pois
as bibliotecárias costumam ter sonhos, sobretudo se forem bibliotecárias
escolares, nisto acredito eu! E se acrescentar que sonhava com livros, leitores
e árvores, também não será extraordinário, pela familiaridade existente entre
as ditas realidades. Qual será o leitor que não experimentou o gozo de se
deixar embalar pela leitura na doce sombra de uma árvore?
Ora, esta Bibliotecária queria plantar uma árvore! Escolheu a
oliveira, árvore mítica, tão cheia de significado! Não sei se na opção pesou a
imagem do ramo no bico de uma pomba em sinal de Paz, se por serem de ramos
folhosos desta árvore que se coroaram os primeiros vencedores dos mais antigos
olímpicos. Tão pouco sei se houve lembrança do fruto transformado em azeite
que, em tempos, iluminou escribas e leitores. Fosse qual fosse a razão, pareceu-me
escolha certa.
E a oliveira chegou à escola num dia sem história, não fora o facto
de 21 de março ser dia de festejo duplo, o da árvore e da poesia. Seria a
“Árvore da Leitura”, assim a nomeou a Bibliotecária. Ficaria à frente da sua
Biblioteca, como que a alimentar-se de livros e leitores.
A oliveira era pequena de tamanho, mas ganharia tronco e
conquistaria espaço naquele lugar que também se faz de afetos. Vigilante e
cúmplice, como vulgar candeia antiga, veria d’ali nascer leitores, testemunharia
o crescimento de outros. Cresceria com eles, alimentar-se-ia deles, como da
chuva que cai do céu, seu teto. Viveria para além da Bibliotecária, para além
dos leitores que veria nascer, crescer, multiplicar-se, como os rebentos que
despontariam, livres, quando os seus frutos caíssem de maduros.
Árvore discreta, consentânea com um tempo que, para as crianças,
corre sempre devagar, crescia lenta, como aliás cresceriam os humanos se também
vivessem mais de 2000 anos, que é a idade que têm certas oliveiras velhas de Israel.
Dizem que a mais velha é
portuguesa e conta com 2850. Teria,
pois, muito tempo para ser!
Quis o tempo, porém, certa noite, que os braços do vento se abatessem
sobre aquele pedaço de terra que lhe dava colo e, com brados e golpes irosos
convocasse um rio para aquele solo de secura.
E foi experiência triste acordar para aquela imagem da árvore de
“pernas no ar”, como qualquer criança que tivesse caído no recreio, de vestido levantado
sobre o ventre, e ali ficasse num lamento triste, à espera que a viessem
levantar.
Mas os dias passaram e ninguém levantou a oliveira e as raízes
secam, sem ciência nem poesia porque o Sol, tal como a Chuva ou o Vento, não
têm contemplações, nem sabedoria bibliotecária.
E eu não sei o que pensará a Bibliotecária quando veste o coração
de poesia, e vê a árvore sonhada a contrariar aquela ideia velha que é a de que
“as árvores morrem de pé´”.
Soni Esteves, junho de 2019
Há muita variedade de sonhos, há sonhos para todos os gostos!!! mas os mais difíceis de concretizar são os que precisam de amor para crescer. Este ingrediente mágico, tão bem descrito por Camões", infelizmente não está ao alcance de todos🤔
ResponderEliminarVerdade. Os sonhos que nascem do amor, também se alimentam dele. E este pulsar, como muito bem diz, não está ao alcance de todos.
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